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Dentro da mente da Mãe de Miguel existia um caos de pensamentos. Quaisquer tentativas de procura de ordem revelavam-se estéreis devido às marés de reflexões, idealizações e cogitações inefáveis que, a reboque da fadiga, mutavam-se em terríficas e tempestuosas batalhas de proporções titânicas e nas quais o questionamento do próprio levava às dissecações mais profundas do ego, processos inevitavelmente condenados ao esquecimento como tantas outras agitações do espírito. É então no fim, quando a cadência eventualmente termina, que sobrava apenas um aglomerado que pesava no corpo e a cansava. Sentia-se, no entanto, particularmente longe de tudo.

 

“Em tempos tinha tomado gosto à preguiça, até que lhe caiu a responsabilidade de cuidar de um ser, obrigada então a sustentar ambos com múltiplos trabalhos e vivendo toda vida no buraco a que chamou casa. Não que fosse decrépita, mas relembrava-a da desilusão que tinha, agora que a ilusão da vida desaparecia para dar espaço a uma realidade esmagadora e sufocante. Era jovem. Sabia-o, mas não o sentia.”
“Que temia? Nada. Temia-se a si mesma. Um medo que provinha do seu desejo de poder ser mais do que era. Gostava de ultrapassar as amarras do mundo e ir mais além, deixar o corpo para trás e nunca mais ser, nunca mais existir, morrer? Talvez. Desaparecer para sempre deste mundo, toda a consciência que um dia teve simplesmente a desvanecer-se de tudo o que é físico, é o mundo antes de nascermos.”
Com uma estrutura rigorosa e uma escrita envolvente, por vezes ligeira, outras mais profunda, Guilherme Pires Correia formula neste romance uma história que segue mãe e filho através dos seus percursos familiares, trajectos profissionais e académicos, círculos de amizade e sentimentos confusos. Os dois protagonistas ilustram de modo exímio o colapso afectivo e a carência emocional da moderna sociedade ocidental e a forma como um quotidiano avassalador e imparável consegue, dentro do mesmo espaço, colocar mãe e filho separados por abismos, partilhando uma solidão intrínseca que torna a dinâmica familiar numa dor que se renova a cada dia. O mundo exterior é sentido como um local pouco habitável e quase inóspito.
São essas memórias, associadas a momentos emocinalmente fracturantes, que Miguel recorda como as primeiras tomadas de consciência e que, de certo modo, o fizeram sentir que era diferente dos outros, moldando-lhe a personalidade e o carácter, levando-o ao longo da existência a constantes indagações filosóficas e perscrutações metafísicas sobre os desígnios da vida e da morte, do amor e da amizade, da ética e da moral.

PAULO CORREIA

 

Guilherme Pires Correia nasceu em 1996 em Lisboa, Portugal. Almadense de raiz, estudou música na Sociedade Filarmónica União Artística Piedense, passando pelo Conservatório Nacional de Música em trompete. O seu interesse pela escrita sempre existiu, mas começou realmente quando estudava na Escola Secundária de Camões. Licenciou–se em psicologia pela Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa, instituição na qual também concluiu o mestrado em Psicologia da Educação e Orientação e onde uniu o seu interesse na escrita à componente académica. Conta com dois contos e um argumento de banda desenhada publicados, bem como algumas distinções de contos em concursos literários. Atualmente trabalha como mediador e monitor de componente de apoio à família no Agrupamento de Escolas Carlos Gargaté em Almada e estuda mediação de conflitos em contexto escolar na Universidade Lusófona do Porto.

 

Detalhes do produto

  • Editora ‏ : ‎ Editora Urutau; 1ª edição (2022)
  • Idioma ‏ : ‎ Português
  • Capa comum ‏ : ‎ 200 páginas
  • Isbn: 978-65-5900-334-1
  • Dimensões ‏ : ‎13x19cm

A minha mãe não tem idade para ser minha mãe - Guilherme Pires Correia

SKU: 9786559003341
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