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O perigo ronda lá fora

Invisível

Insidioso

Estou fechado em casa,
como dentro de um ovo,
talvez
de um útero

Mas não quero nascer

Quero renascer

(Dentro do útero, página 83)

 

Há quem diga que a memória é uma invenção, um reflexo sempre distorcido, mas quando leio Melo, tenho outra sensação: as imagens são descritas de forma metafórica, porém mais reais e transparentes do que qualquer fotografia que eu tenha do meu passado mais recente. Sou tomada por sua capacidade de testemunhar as vivências e expressá-las como um tapa sutil. E é tão física essa sensação, que por um instante duvido se aquela vivência do poeta não era a minha própria. Ler este livro é se enredar nos mistérios de confundir pernas e não saber se as marcas dos pés na vereda são as nossas ou dos demais.
Neste livro, há sempre algo saltando das páginas, alguma dor dele, minha, tua, secular, que nos afunda. Mesmo quando João trata de amor, não é um amor qualquer, mas sim, como disse Heiner Müller em seu poema, das matemáticas que resultam em nada, o deus-zero das hienas.
Poucos conseguem pôr em palavras as angústias, os anseios e os ódios compartilhados sem cair nas repetições cotidianas, lamentadas e repetidas incessantemente. Melo faz. Provoca todos os dias feios e cruéis que já vivemos.
Tenho pânico em pensar que nada nos desvia de nosso destino. Logo eu que nunca acreditei nessas coisas, continuo me iludindo sempre em busca de fugir do que está premeditado. Mas moro no Brasil e mesmo Melo distante dessas terras, já esteve aqui muito e perto, e sabe que os tambores estão estão sempre prontos, há sempre o convite para fazê-los soar conjuntamente e ele descreve nossa língua, nossas sílabas e os horizontes todos numa identidade quase como outra. Entendo a sua reinvindicação identitária, mas mal sabe ele que nessa vastidão de existir, os donos das línguas estão sempre se deparando com vocábulos outros e se preocupam tanto com isso que são os que mais conhecem as novas línguas.
Diz ainda que por ter coração vivo, isso lhe basta. Mas, como sabemos, o poeta é um fingidor. Se não houvesse mais do que batimentos e uma certa quietude (que não é própria desse autor e nunca foi – desde os quentes sangues de coca-cola e antes, muito antes certamente), não teríamos que nos deparar com tempos insidiosos acalorados por essa escrita avassaladora, que nunca se basta, e talvez, por isso não cesse. Vale se enganar que seja suficiente apenas viver, mas a verdade é que nesses e em quase todos os tempos, sempre foi preciso rebelar-se, nem que seja apenas para esperarmos a morte, temprana infelizmente, graças aos mandantes do mundo. Por isso, neste livro, Melo não sucumbe ao medo: enfrenta-o e sublima-o.

Debora Ribeiro Rendelli

 

 

João Melo escritor, jornalista e consultor de comunicação, nasceu em 1955, em Luanda (Angola). Fez os estudos primários e secundários na referida cidade. Estudou Direito em Coimbra (Portugal), licenciou-se em Jornalismo em Niterói (Brasil) e fez o mestrado em Comunicação em Cultura no Rio de Janeiro (Brasil). Foi publicitário, professor universitário, parlamentar (1992-2017) e ministro (2017-2019). Membro fundador da União de Escritores Angolanos e da Academia Angola de Literatura e Ciências Sociais. Atualmente dedica-se exclusivamente à escrita e à consultoria, dividindo o seu tempo entre Luanda, Lisboa e Houston.
Como jornalista, trabalhou e dirigiu vários órgãos de comunicação angolanos, públicos e privados. Foi correspondente de imprensa no Brasil de 1984 a 1992. Em 1992, após a abertura política e económica em Angola, foi um dos fundadores do primeiro jornal angolano independente, o Correio da Semana. Em 2006, criou e dirigiu a revista África 21, especializada em temas africanos. Em 2008, recebeu o Prémio Maboque de Jornalismo, na época a mais importante distinção jornalística do país. Colaborou com vários jornais em todos os países de língua portuguesa. Presentemente, mantém uma coluna regular no Jornal de Angola, Diário de Notícias (Portugal), Sinal Aberto, jornal online português, e no jornal literário Rascunho (Curitiba, Brasil).
Como escritor, publicou até agora 21 livros, entre poesia, contos e ensaios. Editado habitualmente em Angola e Portugal, tem obras publicadas igualmente no Brasil, Cuba e Itália. Tem contos e poemas traduzidos em inglês, francês, alemão, árabe e mandarim, publicados em antologias, revistas e sites literários internacionais, como Words Without Borders (USA), Catamaran Literary Reader (USA), Chicago Quarterly Review (USA), Ellery Queen Mystery (USA), Gávea-Brown (USA), Olongo Africa (Nigéria), The Shallow Tales Review (Nigéria) e Lolwe (Quénia). Em 2009, foi-lhe atribuído o Prémio Nacional de Cultura e Artes de Angola, categoria de literatura.

 

Detalhes do produto

  • Editora ‏ : ‎ Editora Urutau; 1ª edição (2021)
  • Idioma ‏ : ‎ Português
  • Capa comum ‏ : ‎ 158 páginas
  • ISBN: 9786559001606
  • Dimensões ‏ : 12x16,5 cm

Diário do medo - João Melo

SKU: 9786559001606
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