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"Ninguém chorou por ti,

Nem pegou na tua mão cerrada.

Dormiste até adormecer.

Não te sou ninguém.

Mas chorei por ti.

Amanhã há mais"

Miguel Oliva Teles

 

Um jardim é um lugar. E um lugar é o onde-quando em que o tempo e o espaço se cruzam para fazer-se hábito. Mas o hábito - o fazer-se significado até do absurdo - não é algo que permaneça, que se essencialize ou que se transcenda. O hábito, num lugar, é o que persiste na transformação. O jardim de Rosário Alves Cardoso é um lugar em que o hábito se faz no entre: num espaço e num tempo amplos e demorados, onde as coisas fervilham, levitando, entre uma e outra coisa. "Por isso pairas,/Bem longe do que és/E não és balão sequer." O entre, esta distância entre as coisas contrárias, é uma casa. E habitá-la não parece fácil. "Entrem. Fiquem. Bem-vindos ao jardim", somos assim convidados, talvez por alguém que amanheceu estátua e cuja existência é apenas sinalizada por "pontas de cigarros intermitentes". Entrar, poderíamos dizer, é estar no entre. Este não é um convite fácil. Mas entramos. E encontramos então poemas murchando, um pouco por todo o lado. O que será isto de poemas que murcham? Imagino então palavras que levitam - como algo entre um grito e um suspiro, entre o dado e o indizível - e que depois caem na terra húmida, virando húmus. Os poemas murchos são linguagem que habita o entre: o crepúsculo entre a noite e o dia, o cruzamento entre a vida e a morte, a ponte entre a vigília e o sonho, o "cheio vazio" e o "vazio cheio" entre o tudo e o nada, o "imprevisto cósmico" entre o absurdo e o dogma e a "ausência da comunhão do todo" entre o ego e o comum. No Jardim onde os poemas murcham a poesia é matéria viva e morta, onde as coisas se encontram e se misturam. Os poetas são "necrófagos da experiência humana" e do mundo. E os leitores são "abutres que se alimentam do poeta morto". "Escavo e escrevo até o coração bater apenas/Pelas cordas tendinosas que o sustentam./Sou só ridículo/E gosto da audiência desta morte transmitida". Entramos. E a meio das estátuas, das flores várias, da areia e deste húmus, descobrimos que o jardim do entre é também o lugar da alteridade. E que este lugar se pode habitar de várias formas. Com indiferença, soberba e sarcasmo. Ou com empatia - esse gesto que se deleita no esforço do impossível. Rosário Alves Cardoso parece conhecê-las a todas e parece ter escolhido a sua. 
 

 

Rosário Alves Cardoso nasceu em 1991, em Setúbal, Portugal.
Apesar de procrastinar ser a sua maior fonte de felicidade, consegue exercer Medicina a tempo inteiro. A despeito de uma infância marcada pelo ódio à Cartilha e dificuldade em dizer os Rs do seu nome, descobriu na escrita uma forma de terapia. Explorou a criatividade na escola, porém a poesia foi-lhe transmitida geneticamente pela avó. Não tem uma vasta carreira na área, as más-línguas dirão que nenhuma, mas é preciso começar um dia.

 

  • Editora ‏ : ‎ Urutau; 2023
  • Idioma ‏ : ‎ Português do Brasil
  • Capa comum ‏ : ‎ 104 páginas
  • ISBN: ‎ 9786559006700
  • Dimensões ‏ : ‎160 x 20 x 230 mm

O jardim onde os poemas murcham - Rosário Alves Cardoso

SKU: 9786559006700
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